M75 - Filhos do vento
António Bento, cumpriu SMO em Angola, onde chegou em Set73; primeiro em Lumbala, mais tarde no Luvuei.
Em Dez12 tivemos o privilégio de, com alguma reserva, aqui divulgar, uma carta deste nosso camarada (M42- Uma História de Vida).
Hoje a noticia é publica. O A.B. pôde finalmente abraçar o filho
ps://www.facebook.com/nun.azev/posts/802289759868176
2015-06-19
2015-06-10
2015-06-07
M73 - As cartas do ultimato
Luquembo, 1974
Luquembo, 1974
A Casa das Palancas (ver M48) está em grande
Com as limitações inerentes deste micro-cosmo, cumpre a quota parte da animação “cultural” local.
As noites correm e improvisa-se no instante; ontem foi conversa com os mais velhos da sanzala, hoje é noite de farra, bar aberto, amanhã se verá o que chega primeiro; nada que perturbe a capacidade de estabelecer planos de contingência, um dos atributos maiores do militar que se preza
E as tardes? Tenho de reconhecer que tenho vindo a aproveitar mais as oportunidades para me isolar e relaxar a seguir à primeira refeição do dia. Um grupo arbóreo de copa densa, protege a casa nas horas em que os raios solares são mais agressivos. A abertura simultânea das duas janelas, propicia uma serena corrente de ar, que mor das vezes ameniza o ambiente.
O que acima alinhei, estaria na página do diário que imagino perdida, mas que de facto nunca foi escrito.
Tantos anos decorridos a memória continua a ser companheira fiável, e bastante para o que se quer relevar.
Bons e especiais momentos, designadamente os partilhados com as jovens indígenas, generosas nos seus verdes anos, como eram também os nossos; algumas de espírito livre e coração aberto, em conversas de palavras simples invariavelmente plenas de sotaque africano, que podiam também ser de conforto ou ao invés, em conversas temperamentais e devassas
Muitas vezes ocorreu-me um verso de Neruda, se bem que o poeta o tivesse moldado noutro contexto ... "Terra de semente inculta e bravia".
A mais vivaça, com alguma ajuda, conseguia replicar com os dois versos seguintes:
"Terra onde não há esteiros ou caminho
Sob o Sol minha vida se alonga e estremece"
Frequentemente insistia em dizer que não compreendia os versos que pronunciava, mas adivinhava-se-lhe no olhar que gostava de pisar terreno de Eros; com sorriso insinuante repetia o "minha vida se alonga e estremece"
Idiossincrasias à parte, hoje a questão primeira é outra: prosaica e singular.
Há dias, em mais uma tentativa de introduzir ordem nos meus arquivos mais esconsos, encontrei um documento a que tinha perdido o rasto. Trata-se de uma carta, que considero que testemunha o mérito e a capacidade de conseguir ser diferente, de duas das nossas amigas locais, de presença mais assidua. Por uma questão de princípio os nomes dos distintos alferes a que é (são) dirigida(s) e os das autoras que deram forma aos ultimatos, foram suprimidos.
Releio as cartas, e como tantas vezes ouço de um primo meu que foi nosso companheiros da jornada africana, também sou capaz de confessar: "que saudades".
Leiam também s.f.f.
Com as limitações inerentes deste micro-cosmo, cumpre a quota parte da animação “cultural” local.
As noites correm e improvisa-se no instante; ontem foi conversa com os mais velhos da sanzala, hoje é noite de farra, bar aberto, amanhã se verá o que chega primeiro; nada que perturbe a capacidade de estabelecer planos de contingência, um dos atributos maiores do militar que se preza
E as tardes? Tenho de reconhecer que tenho vindo a aproveitar mais as oportunidades para me isolar e relaxar a seguir à primeira refeição do dia. Um grupo arbóreo de copa densa, protege a casa nas horas em que os raios solares são mais agressivos. A abertura simultânea das duas janelas, propicia uma serena corrente de ar, que mor das vezes ameniza o ambiente.
O que acima alinhei, estaria na página do diário que imagino perdida, mas que de facto nunca foi escrito.
Tantos anos decorridos a memória continua a ser companheira fiável, e bastante para o que se quer relevar.
Bons e especiais momentos, designadamente os partilhados com as jovens indígenas, generosas nos seus verdes anos, como eram também os nossos; algumas de espírito livre e coração aberto, em conversas de palavras simples invariavelmente plenas de sotaque africano, que podiam também ser de conforto ou ao invés, em conversas temperamentais e devassas
Muitas vezes ocorreu-me um verso de Neruda, se bem que o poeta o tivesse moldado noutro contexto ... "Terra de semente inculta e bravia".
A mais vivaça, com alguma ajuda, conseguia replicar com os dois versos seguintes:
"Terra onde não há esteiros ou caminho
Sob o Sol minha vida se alonga e estremece"
Frequentemente insistia em dizer que não compreendia os versos que pronunciava, mas adivinhava-se-lhe no olhar que gostava de pisar terreno de Eros; com sorriso insinuante repetia o "minha vida se alonga e estremece"
Idiossincrasias à parte, hoje a questão primeira é outra: prosaica e singular.
Há dias, em mais uma tentativa de introduzir ordem nos meus arquivos mais esconsos, encontrei um documento a que tinha perdido o rasto. Trata-se de uma carta, que considero que testemunha o mérito e a capacidade de conseguir ser diferente, de duas das nossas amigas locais, de presença mais assidua. Por uma questão de princípio os nomes dos distintos alferes a que é (são) dirigida(s) e os das autoras que deram forma aos ultimatos, foram suprimidos.
Releio as cartas, e como tantas vezes ouço de um primo meu que foi nosso companheiros da jornada africana, também sou capaz de confessar: "que saudades".
Leiam também s.f.f.
Azevedo
2015-06-05
M72 - O Comandante da Formação
De facto o verdadeiro Comandante. O homem a quem ainda não tinham reconhecido mérito para o ser, mas que de facto foi o comandante da CCS. Nos finais de 2013, fiz-lhe uma visita de e encontrei-o rijo e bem disposto, apesar de algo achacado com os pés. Coisa pouca para o homem que sonha a fazer poemas de quadra cruzada e que acolhe feliz todos os pedidos de mais rimas, dos camaradas do núcleo de Coimbra.
É o Capitão Arnaldo Luz.
De facto o verdadeiro Comandante. O homem a quem ainda não tinham reconhecido mérito para o ser, mas que de facto foi o comandante da CCS. Nos finais de 2013, fiz-lhe uma visita de e encontrei-o rijo e bem disposto, apesar de algo achacado com os pés. Coisa pouca para o homem que sonha a fazer poemas de quadra cruzada e que acolhe feliz todos os pedidos de mais rimas, dos camaradas do núcleo de Coimbra.
É o Capitão Arnaldo Luz.
2015-04-22
2015-03-26
M69 - A piscina do Lucusse
No livro chamado Maravilhas do Mundo (ed. 1933), R Halliburton escreveu que “... a Grande Muralha (GM) é a única obra do homem que pode ser vista do espaço”
No livro chamado Maravilhas do Mundo (ed. 1933), R Halliburton escreveu que “... a Grande Muralha (GM) é a única obra do homem que pode ser vista do espaço”
Em 1972, o astronauta G. Cernan, após regressar da missão Apolo
17 confirmou que quando em órbita, a 320 kms da Terra, tinha divisado a GM.
Em 2003 o astronauta chinês Yang Liwei, que deu 10 voltas à Terra
na Shenzhou 5 disse que apesar de se ter esforçado não tinha avistado a muralha.
Desfez-se o mito; ainda que o observador esteja em voo orbital o mais baixo admissível,
não há construção humana, que seja de facto visível a olho nu.
Cerca de um anos depois, ou seja em 2004, a Keyhole
(curiosamente uma empresa criada pela CIA), vendeu à Google um programa chamado
EarthViewer 3D.
Bem hajam pelo acordo de negócio; hoje, dispomos de um
software magnifico … o –google Earth
Tinha-me há tempos ocorrido que observar do espaço os outros
espaços terrenos africanos em que estivemos confinados durante 27 meses,
poderia constituir motivo para alguma reflexão ou comentário que no presente
estimulasse memósria antigas que todos
mais ou menos partilhamos.
Por isso, accionei o Google Earth e marquei o destino: Lucusse
É um espanto este programa, já estou de saída do voo orbital
virtual e mergulho no interior de Angola.
O rigor da navegação facilita a captação de registos da
imagem do solo.
No que, o primeiro temos o Lucusse quase centrado e três
vias (em tom amarelo) radiais; para a esquerda alta, segue para o Luso, a da direita
alta, para o Lunhamege e para sul a que dá acesso ao Lungué-Bungo.
No segundo registo, a partir de uma posição a menor
altitude, são ainda perfeitamente identificáveis as vias radiais acima referidas.
Recorri a uma ferramenta do Google Earth que permite delimitar
uma qualquer zona do solo; no caso parece-me que estão correctamente identificados
o campo de futebol (pelado) e o espaço que terá sido ocupado pelas instalações
militares.
Se a memória não me falha, próximo do canto NW do
aquartelamento, situava-se uma passagem de peão que dava acesso ao campo da
Tecnil.
A partir do ponto em que estaria esta passagem de peão, foi
marcada no registo de observação seguinte, uma linha sinuosa com que procuro
representar um eventual trilho de pé posto. Na extremidade desta linha está
penso, perfeitamente identificavel a obra (elefante branco) do Mj. ASS.
A mui célebre piscina do Lucusse (para melhor observação clicar na imagem)
Um dia em que a obra já ia algo avançada, deu um ar de graça
ao tentar sugerir que … nem sei!...
Talvez sugerir que lhe estava escrito no destino, uma vez
que invocou uma frase de Pessoa: “Deus quer, o homem imagina, a obra nasce”.
Fiquei siderado.
É sabido que esta obra megalómana – uma vez concluída dava
para albergar em simultâneo todo o pessoal da CCS – começou por ser uma
proposta de voluntariado e poucos dias decorridos passou a trabalho por escala.
Teve um gast
o enorme de cimento que poderia, caso tivesse
optado por uma geometria mais modesta, ter sido utilizado em melhoramento das
instalações militares ou do bem estar dos residentes na sanzala.
Uma vez carregada com água, revelaram-se fugas várias; nunca
chegaram a ficsr totalmente controladas.
Procurei nos meus arquivos uma fotografia que desse ideia da
dimensão da dita piscina, mas só encontrei uma em que o campo estará reduzido a
talvez 1/6 do que era a realidade.
Mas, tem um mérito, e por isso vai aqui ficar; testemunha uma
das primeiras lições de natação que ali tiveram lugar.
Compenetrado o (à data) Furriel MO (de t-shirt preta), observa e tenta executar em seco a técnica natatória, demonstrada pelo esforçado instrutor.
Azevedo
2015-03-24
O filme MASH
(acrónimo de Mobile Army Surgical Hospital), de R. Altman foi estreado em
Portugal nos finais de 1974. Quando regressei da ZMAngola, em finais de
Setembro deste ano, agarrei a oportunidade de rever o que me tinha ficado
registado de forma indelével do filme que tivera oportunidade de visionar fora
de portas em 71; rever as interpretações do naipe de bons actores: dos
impagáveis Duke, Hawkeye e Trapper, do desconcertante Radar e da sedutora
Hot-Lips.
Um primor de
anti-militarismo, em que sobre cenários da guerra da Coreia, se criticava a
guerra de Vietname; uma sátira, mas também uma mensagem tão poderosa quanto a
que ainda iria descobrir, algum tempo depois, no primeiro visionamento do filme
de Sidney Lumet, A Colina Maldita (the Hill).
As mensagens
de MASH, iriam ter uma quota parte de influência na minha travessia dos anos
72-74.
Desde muito
cedo constatei que um dos quadros do BArt reunia um conjunto de características
negativas que amiúde me obrigava a compara-las com estereótipos da obra
inspiradora de Richard Hooke.
E, a breve
trecho, foi só juntar letras e saiu: ASS
Há dias
passei minutos de sorriso alargado com recordações esparsas de algumas das
situações em que esteve envolvido e que tive oportunidade de observar.
Participei numa das mais, sui generis; e recordo o exercicio de controlo que foi manter cara-de-pau, onde o cenário era mais para o hilariante
Participei numa das mais, sui generis; e recordo o exercicio de controlo que foi manter cara-de-pau, onde o cenário era mais para o hilariante
Passo então
à descrição dos antecedentes e da conclusão.
Estávamos
ainda no Lucusse; era uma tarde de ócio quente, como muitas outras em que o
pensamento perseguia tudo e nada. À falta de melhor, pareceu-me que era chegada
a altura de ensaiar uma velha brincadeira a que dava o título de molha-gatos; a
diversão ia consistir em colocar no bordo superior da porta de acesso às
instalações sanitárias dos oficiais subalternos, uma muito partilhada bacia de
plástico encarnada, carregada com 4 a 5 litros de água.
Decorria
daqui que o primeiro apressado e/ou desatento que quebrasse o equilíbrio
instável do sistema, levava com a carga líquida e logo de seguida com o
recipiente.
E, foram vários os que se envolveram na experiência como vítimas e diversas as exclamações, no mais puro vernáculo, que foram proferidas a horas e desoras
Não tardou que o conhecimento e as consequências da "armadilha" se tornassem conhecidas, como agora se diz, transversalmente.
E, foram vários os que se envolveram na experiência como vítimas e diversas as exclamações, no mais puro vernáculo, que foram proferidas a horas e desoras
Não tardou que o conhecimento e as consequências da "armadilha" se tornassem conhecidas, como agora se diz, transversalmente.
E também
"verticalmente", como se demonstra no episódio da armadilha accionada
pelo, à data, Mj ASS
Num belo fim
de tarde, em que tinha a "armadilha" montada, e estava à conversa no
que era pomposamente designado por bar de oficiais, entra o Mj ASS, que, poucos
minutos decorridos, se aproxima e sussurra que tem algo a dizer-me, porém
sujeito a confidencialidade. Deixo a cavaqueira e sigo-o até ao local para onde
se tinha encaminhado: o pequeno hall de entrada do JC, onde se iniciava o
corredor de acesso aos quartos dos subalternos, e ainda estava a porta que abria para as
instalações sanitárias.
Aí começa com uma conversa frouxa, sem nexo e a dar-me pequenos toques nos ombros. Constato que ele está a deslocar-se circularmente, obrigando-me a rodar para o enfrentar. Estranho o comportamento e, como o hall era mesmo pequeno, olho por cima do ombro para avaliar o espaço de manobra que tenho, sem correr o risco de ficar molhado.
Nesse preciso momento, percepciono um movimento abrupto de ataque, de que me esquivo rápido; o Mj. ASS, entra em desiquilíbrio, e de braços projectados para a frente, prossegue em direcção à porta "armadilhada".
Aí começa com uma conversa frouxa, sem nexo e a dar-me pequenos toques nos ombros. Constato que ele está a deslocar-se circularmente, obrigando-me a rodar para o enfrentar. Estranho o comportamento e, como o hall era mesmo pequeno, olho por cima do ombro para avaliar o espaço de manobra que tenho, sem correr o risco de ficar molhado.
Nesse preciso momento, percepciono um movimento abrupto de ataque, de que me esquivo rápido; o Mj. ASS, entra em desiquilíbrio, e de braços projectados para a frente, prossegue em direcção à porta "armadilhada".
A água cai
implacável e quase em simultâneo a bacia. Consigo escapar apenas com uma manga
da camisa meia molhada; ele apanhou bem mais. Porém há uma nota extemporânea,
um grito, não de desconforto, mas de dor aguda.
Recomponho-me
e vejo-o com o corpo ligeiramente dobrado, aos saltinhos, ombros comprimidos, a
mão esquerda no sovaco da direita, de esgares múltiplos no rosto ... e com a
ladainha ai, ai, ui, ui …
Havia razão
para tal; nos instantes subsequente à entrada em fase de desiquilíbrio,
tinha de passagem, conseguido enfiar a extremidade do dedo mínimo da mão
esquerda, no espaço entre o quadro da porta e o bordo desta.
Só me
restava uma opção, a de o responsabilizar pelo ataque e afirmar que nunca
esperaria que ele estivesse ali para me empurrar.
E o Mj. ASS
acedeu
No fim,
ainda teve sorte por a falangeta não ter sido castigada para além do limite
elástico; ficou-se por uma luxação simples se bem que, como se aceitará, muito
dolorosa
Nos dias que se seguiram vi-o por diversas vezes a tentar a avaliar o nível de recuperação da luxação.
Nos dias que se seguiram vi-o por diversas vezes a tentar a avaliar o nível de recuperação da luxação.
Nunca senti
remorsos; só me ocorria uma algo anarca e profunda reflexão: "ninguém te
mandou meter o dedo no cu da galinha".
Azevedo
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