2013-09-15

M55 - Memórias da minha tropa

Tínhamos chegado ao Lucusse, havia poucos dias. O camuflado novo em folha do “maçarico”, ainda estava hirto de tanta goma, apresentando-se com as cores vivas, próprias do pouco uso e poucas lavagens.
Integrado num grupo composto pelos Pelotões de Reconhecimento e Sapadores da CCS e muitos militares dos “velhinhos” que fomos render, montados nas Berliets, partimos rumo a um destino desconhecido, mas que se sabia ser uma missão de reconhecimento da região.
Umas boas três horas de picada, findas as quais apeamos e munidos dos inseparáveis sacos com as rações de combate e restante equipamento, formamos uma fila indiana que serpenteava mata adentro.
Para quem ali tinha chegado há tão pouco tempo, logo despejado num cenário daqueles, escusado será dizer que, o medo se fazia notar, ao contrário do que reflectiam os rostos dos “velhinhos”.
Como cautelas e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém, a G3 ia municiada com bala na câmara, pró que desse e viesse, não fosse o diabo tecê-las.
E não é que aconteceu mesmo?
No segundo dia de caminhada, palmilhando no capim, ora por entre o arvoredo, ora atravessando enormes planícies alagadas, a determinada altura, ouviram-se disparos dos “velhinhos”, lá na frente, muitos disparos.
Atónitos, pensando que estávamos a ser atacados, de arma aperreada e todos os sentidos alerta, tentamos proteger-nos, mandando-nos imediatamente para o chão.
Valha-nos Deus, Virgem Maria - pensei ser o fim! Iria morrer ali mesmo? Mas não, logo se fez silêncio, um enorme silêncio e tudo acalmou.
Passaram palavra para trás, que não havia inimigo, mas tinham matado um boi cavalo. Calhou-me em má sorte poder ir ver o bicho...
Com o medo afastado e já cheio de coragem, armado em guerrilheiro, lá fui. O problema é que o raio do animal estava para além de uma linha de água que ali havia e se o queria ver, teria de a atravessar.
Assim, todo vestido e calçando as minhas botas novas de lona, não hesitei, meti-me àquela travessia com água até à cintura.
Acabei por não ver bicho nenhum! Não sei mesmo se alguém  o viu. Ainda hoje tenho sérias dúvidas se ele existiu mesmo ou seria uma patifaria, uma grande partida dos camaradas que se iam dali embora em breve, para nos testarem…
De qualquer forma, maldita hora aquela… A água da ribeira fez apertar as botas, que molhadas, fizeram com que ao caminhar, os pés se comprimissem de tal forma dentro delas, que ficaram numa ferida só, em carne viva…
O mesmo aconteceu a vários, pelo que a restante operação foi feita com grandes dificuldades.
Alberto Fontes
ex 1º Cabo Enfº da CCS

1 comentário:

  1. Grande "maçarico" e "aramista"....
    Um abraço grande, meu amigo.
    Feio

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